SÉRIE: ANGOLA COMO ELA É - Parte 5 (Final)
CONCLUSÕES
Fui tratar de alguns documentos em Luanda, e como disseram que a fotografia que tinha não dava, porque o fundo não era suficientemente branco, tive que ir tirar outra.
Tirei esta:
A princípio tudo bem... Tinha os formulários todos preenchidos, tudo o que precisava numa pasta. Mas a foto não podia ser esta. A camisa não pode ter letras.
O meu pai disse que já estava a adivinhar. Havia uns fotógrafos na porta do local onde estávamos a tratar da documentação, que tiram fotos tipo passe a quem tem problemas com as que traz.
Acontece quase sempre de metade das pessoas terem que ir pedir aos rapazes para tirar "uma fotografia adequada". Ao que parece, os fotógrafos pagam comissão...
Enfim.. não tinha outra forma, fui à procura de um dos fotógrafos. O detalhe é que eu estava com a camisa que tinha na foto, porque tinha tirado nesse dia, então para tirar uma nova, tive que pôr a minha t-shirt do avesso...
Fui à casa-de-banho, pus-me do avesso e fui ter com um dos rapazes. Afinal a casa de fotografias ainda era noutra rua, e sem tempo de avisar ao meu pai, fui guiada para um beco:
Comecei logo a pensar que ia ter que lutar com alguém. E o meu pai não sabia de mim.. Depois ele confessou-me que pensou que me tinham raptado.
O fotógrafo meteu-me numa parede que tinha um lençol estendido para fazer de fundo branco. Endireitou-me os ombros e tirou-me uma foto.
Esperei uns minutos e ele voltou a dizer que a foto não tinha ficado bem... Que se via muito o cabelo e que não se via as orelhas. E eu: "O quê? Como assim não se vê as orelhas? As orelhas são para se ver?"
Ao que parece sim... "Mana, vamos ter que pôr guardanapo atrás das orelhas para se ver!" E eu:" Eu não vou pôr nada atrás de nada! Ninguém me disse isso, só me disseram que não podia ter letras na camisa!"
"Eu sei mana, eles não só dizem uma coisa de cada vez! Quando levares estas fotos, vão te mandar vir cá outra vez. É melhor já fazer tudo!"
Caramba, ele podia não ter dito nada, e ter-me tirado mais dinheiro...
Deram-me um guardanapo, cortaram umas tirar e fizeram umas bolinhas:
Enquanto me preparava para tirar o última foto, com a camisa do avesso, com o cabelo todo puxado para trás, com guardanapo atrás das orelhas, e com o fotógrafo a endireitar-me os ombros e a cabeça como se eu fosse um quadro de parede, comecei a rir-me à gargalhada com toda a situação.
O fotógrafo começou a rir, a minha prima que estava comigo começou a rir. A minha felicidade maior foi aperceber-me que, se eu não tivesse a perspetiva que fui ganhando ao longo do tempo, eu não estaria a rir. Estaria chateada por ter que tirar mais fotos, estaria irritada com o rapaz, estaria a zangar-me e talvez até a gritar e a ser mal-educada.
O resultado final foi assombroso:
Nádia Alien... Contei esta história a toda a gente com quem me sentava para conversar... "Tenho história super engraçada para contar!" Começava eu já a rir... Querendo ou não, as pessoas que ouviam já riam também!
Engraçado, tenho a certeza que se eu começasse a contar a história chateada e num tom agressivo "Pah, este país é incrível, sabes o que me aconteceu hoje?", que as pessoas entrariam na onda de também reclamar do país.
Chego à conclusão que as pessoas que nos rodeiam, as culturas, as pessoas, os acontecimentos, eles são o que nós somos. Quando descreves algo estás a descrever-te a ti.
Pessoas amarguradas vêm amargura em tudo, pessoas tristes vêm tristeza em tudo... Mas as pessoas felizes vêm felicidade até em becos assustadores. E conseguem fazer com esses becos surjam sorrisos, risos e gargalhadas.
E é assim que tocamos na vida das pessoas:
"Obrigada rapaz, pela tua sinceridade e profissionalismo. Deus vai honrar o teu trabalho! Vamos tirar uma selfie?"